27 abril 2012

CULTURA, SOCIEDADE, ECONOMIA

MEIO AMBIENTE      MEIO AMBIENTE



Ruralistas dão motivos para Dilma vetar mudanças no Código Florestal


Brasília - Por 274 votos a favor, 189 contrários e 2 abstenções, a Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (25), o relatório do deputado Paulo Piau (PMDB-MG) que modifica o Código Florestal, impondo sérios retrocessos à legislação ambiental brasileira.

O resultado foi uma derrota para o governo federal que defendia a aprovação na íntegra do texto definido pelo Senado, no final do ano passado, ao qual considerava fruto de um acordo com os representantes do agronegócio no parlamento. Reiteradas falas do governo anunciaram que o texto dos senadores não era o ideal, mas o possível de ser alcançado pela mediação dos interesses presentes no Congresso Nacional. 

A bancada ruralista na Câmara, entretanto, manteve-se fiel apenas ao seu programa e incorporou mais de vinte alterações ao texto do Senado, que já representava um retrocesso na legislação ambiental para organizações sociais diversas, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Via Campesina, ONGs como Greenpeace, SOS Mata Atlântica e Instituto Socioambiental, entre outras.

A expectativa destas organizações é de que a presidenta Dilma Roussef vete as mudanças para proteger o Código Florestal. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), disse na terça-feira (24) que a presidenta vetaria o texto, caso ele fosse aprovado com as alterações propostas por Piau. 

De tudo que foi apresentado pelo relator, apenas uma proposta não vingou. Mas, por força do regimento interno e não da vontade de Piau ou da maioria do plenário. A proposta que retirava a necessidade de recomposição de 15 metros da mata ciliar de rios com até 10 metros de largura foi recusada por se tratar de um texto já aprovado tanto pela Câmara quanto pelo Senado nos turnos anteriores de tramitação.

A presidenta Dilma ainda não se manifestou, mas possui uma lista de motivos para utilizar sua prerrogativa de veto: o rompimento do acordo por parte dos ruralistas, seus compromissos de campanha de não aprovar nada que aumente o desmatamento e promova a anistia de desmatadores e a pressão internacional às vésperas da Rio+20.

Gozando de popularidade recorde, tendo em mãos um projeto cuja antipatia da população é comprovada por pesquisas de opinião e contando com apoio de setores expressivos da imprensa, de movimentos e organizações sociais, da ciência e da religião, a presidenta tem um amplo ambiente favorável para enfrentar a decisão de numerosos deputados e o desgaste político que dele pode ser oriundo.

Paulo Piau chegou a desafiar o governo no primeiro dia de votação. "Se vetar, nós derrubamos o veto", disse, acompanhado pelo líder do PMDB e futuro presidente da Câmara em 2013, Henrique Eduardo Alves (RN).

A Constituição permite à Dilma vetar dispositivos - artigos, incisos ou alíneas – inteiros, e não partes deles, ou o texto completo. Para tal, ela terá 48 horas, contadas a partir do recebimento do projeto aprovado na Câmara, para comunicar o presidente do Congresso Nacional, o senador José Sarney (PMDB-AP), justificando as razões do veto. A decisão presidencial poderá ser derrubada pela maioria absoluta, metade mais um, de cada Casa, ou seja, por 257 deputados e 41 senadores. E aí reside o maior perigo para o governo em caso de veto. Na Câmara, os ruralistas comprovaram que sua proposta é majoritária. Restaria saber como se comportariam os senadores neste novo cenário. A apreciação de vetos presidenciais são realizadas por meio de voto secreto.

Mudanças 
Entre as novas mudanças aprovadas no Código Florestal está a retirada da obrigação de divulgar na internet os dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro cartográfico dos imóveis rurais que facilita o monitoramento das produções agropecuárias e a fiscalização de desmatamentos. Assim como excluíram o artigo que exigia a adesão de produtores ao CAR em até cinco anos para o acesso ao crédito agrícola.

O Ibama não poderá bloquear a emissão de documento de controle de origem da madeira de estados não integrados a um sistema nacional de dados.
Os estados da Amazônia Legal com mais de 65% do território ocupado por unidades de conservação pública ou terras indígenas poderão diminuir a reserva legal em propriedades em até 50%.

Foi derrubada a obrigatoriedade de recompor 30 metros de mata em torno de olhos nascentes de água nas áreas de preservação permanente ocupadas por atividades rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. Foi retirada ainda do texto a regra de recomposição de vegetação nativa em imóveis de agricultura familiar e naqueles com até quatro módulos em torno de rios com mais de 10 metros de largura.

Também foi retirada a definição de pousio, período sem uso do solo para sua recuperação, que permitia a interrupção de, no máximo, cinco anos de até 25% da área produtiva da propriedade. Com isso, áreas ilegalmente desmatadas há mais de uma década, mas hoje com florestas em recuperação serão automaticamente consideradas como produtivas e, assim, poderão ser legalmente desmatadas. Como também retirou-se o conceito de área abandonada, prejudica-se a reforma agrária, pois já não haverá terras subutilizadas por especuladores, mas apenas áreas “em descanso”.

Também foi retirado do texto a necessidade de os planos diretores dos municípios, ou suas leis de uso do solo, observarem os limites gerais de áreas de preservação permanente (APPs) em torno de rios, lagos e outras formações sujeitas a proteção em áreas urbanas e regiões metropolitanas. Também foi aprovado o destaque que não considera apicuns e salgados como APP.

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
Fonte: www,cartamaior.com.br 



 



CULTURA E SOCIEDADE


LAMPIÃO ERA GAY?

Por Beatriz Mendes, na Revista CartaCapital 


Imagine não saber que Vinicius de Morais foi um artista boêmio. Ou que Manuel Bandeira sofria de uma forte tuberculose e que Raul Seixas era viciado em álcool e drogas. São essas características que dão à personalidade de uma figura pública pequenas pitadas de humanismo e de proximidade com seus fãs. Por vezes, essas marcas são essenciais para que as obras deses artistas sejam compreendidas e cedem certo grau de comicidade à sua biografia – como a clássica imagem atribuída a D. João VI, sempre carregando uma gorda coxa de frango em uma das mãos.
Dificilmente alguém se recusa a reconhecer a importância desses relatos da vida das celebridades. Entretanto, a publicação de biografias não autorizadas às vezes gera atritos entre o autor e as famílias desses artistas, que não querem ter a intimidade de seu parente – e também a sua própria – revelada à população. No Brasil, por conta de processos judiciais, essas obras podem ser até mesmo recolhidas das livrarias – uma ação que fica na linha tênue entre o respeito à privacidade e a afronta à liberdade de expressão.
De acordo com a biografia, Lampião seria gay e viveria um triângulo amoroso com Maria Bonita e o também cangaceiro Luiz Pedro
Recentemente foi a vez da vida de Lampião ser foco de polêmicas. Em novembro do ano passado, Aldo Albuquerque, juiz da 7ª Vara Cível de Aracaju, expediu uma liminar – a pedido de Expedita Ferreira, filha do cangaceiro – suspendendo a publicação do livro Lampião mata sete, no qual o juiz aposentado Pedro de Morais defende a tese de que Virgulino Ferreira da Silva, o famoso Rei do Cangaço, seria homossexual. “Não chega a ser nem um capítulo do meu livro, mas eu questiono o assédio dele aos meninos do cangaço e o fato de eles serem tão próximos”, explica Morais, em entrevista à CartaCapital. Albuquerque manteve a ordem de proibição em ação divulgada no último dia 11.
O juiz de 67 anos conta que seu trabalho não foi o primeiro a tratar do assunto. Segundo ele – que se diz um aficionado por Lampião desde criança -, o historiador e antropólogo Luiz Mott já havia abordado a suposta homossexualidade do cangaceiro. “O professor já falava sobre isso 30 anos atrás. Tem uma tese na Sorbornne que cita esse lado feminino de Lampião. Todo mundo aqui no nordeste sabe que ele era um exímio estilista e gostava de plumas, paetês e perfumes franceses”, defende-se.
Mas não é só a orientação sexual do Rei do Cangaço que foi abordada. Pedro de Morais também colocou a fidelidade de Maria Bonita à prova. “Maria Bonita foi um personagem criado pela literatura de cordel. Todos sabem que existia um triângulo amoroso entre ela, Lampião e Luiz Pedro. Estácio de Lima, o maior defensor do cangaço no País foi o primeiro a dizer isso”.
Para Morais, sua biografiade Lampião foi a primeira a ser proibida no País porque é sincera. “Todo mundo tratou do mito. O que eu fiz foi falar sobre Lampião, o bandido”, argumenta. O juiz afirma, ainda, que o fato de ele ter afirmado que o Rei do Cangaço era gay não é justificativa suficiente para a proibição. “Eu falei que ele era um facínora, bandido, ladrão, cruel e nunca houve problema algum. Inclusive, a família até respeita a divulgação desses fatos. Agora eu digo que Lampião era gay e as pessoas proíbem o meu livro? Eu acho que esse pessoal é muito preconceituoso”, dispara.
Outro Lado 
Aldo Albuquerque afirma que se baseou na Constituição para vetar o lançamento de Lampião mata sete. O juiz, que não leu o livro, avaliou o teor da obra de Pedro Morais a partir de uma entrevista concedida por ele ao jornal Cinform, publicação que circula em Sergipe. Aliás, foi a partir da mesma reportagem – intitulada “Lampião era boiola e não tinha capacidade de ereção” – que a filha do cangaceiro ficou sabendo do lançamento da biografia. “Não li o livro, pois não foi juntada cópia no processo. Apesar disso, pelas próprias palavras do autor do livro na entrevista, percebe-se facilmente que a obra agride a imagem de Lampião”, analisa.
Albuquerque acredita existir uma diferença entre relatar os crimes do cangaceiro e falar sobre sua orientação sexual. “Os crimes praticados por Lampião são fatos sociais, públicos e cuja apuração e circunstâncias devem ser levadas ao conhecimento da população sem restrições, pois nesse caso existe legítimo interesse social. Por outro lado, ninguém tem o direito de tratar da opção sexual de quem quer que seja, com exceção da sua própria. Imagine se alguém, com base na liberdade de expressão, divulgue uma notícia, dizendo que determinada pessoa pública, casada, somente mantém relação sexual com o cônjuge, uma vez por mês?”, questiona.
Projeto de Lei
O deputado federal Newton Lima (PT-SP) discorda de Aldo Albuquerque. “É um equívoco, não cabe ao juiz dar uma sentença a partir de um juízo de valor próprio sobre o que é relevante ou não em uma obra. Porque cada um tem pensamentos religiosos, ideológicos e morais diferenciados. Ele deve julgar à luz da constituição e não a partir de suas concepções de vida”, critica.
O deputado é o autor de um projeto de lei que pretende modificar o artigo 20 do Código Civil brasileiro, para garantir a divulgação de imagens e informações biográficas sobre pessoas de notoriedade pública, cuja trajetória pessoal tenha dimensão inserida em acontecimentos de interesse da coletividade. “O que queremos mostrar é que, ao se escrever a biografia de um determinado personagem de nossa história, seja um político, um artista ou até mesmo um anônimo ou um homem simples do povo, o que se está escrevendo é a própria história da sociedade na qual o personagem está inserido, uma vez que não existe sujeito histórico isolado, sem uma contextualização de sua vida no espaço e tempo históricos.”
Lima afirma que a legislação brasileira a tratar do assunto é ambígua, pois não faz distinção entre pessoas públicas e anônimas. “É evidente o protagonismo que um jogador de futebol consagrado ou artista popular exercem sobre a tomada de escolhas das pessoas ditas comuns. Desde a simples adoção da mesma modalidade de corte de cabelos até a inspiração de comportamentos e condutas diretamente ligadas à figura da pessoa pública, percebemos que tais personalidades desempenham papel de verdadeiras pessoas-espelho para um amplo corpo social”, afirma.
O deputado argumenta que é necessária uma adequação do Brasil à realidade internacional. “Em outros países, como, por exemplo, a Inglaterra e os Estados Unidos, o fato das personalidades frequentarem constantemente a mídia diminui o seu direito de imagem e privacidade, tornando lícitos, por exemplo, a publicação de biografias não autorizadas e a realização de obras audiovisuais sobre elas, sem a necessidade de prévio consentimento.”
O projeto de lei já foi aprovado e agora será apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça. No País, biografias de Roberto Carlos, Garrincha e João Guimarães Rosa são exemplos de obras que já foram vetadas.



Gladiadores modernos

Por Menalton Braff, na Revista CartaCapital

Foto: Nagillum/Flickr
“Indivíduo que nos circos romanos combatia com outros homens ou com feras, para divertimento público.”
Para quem escreve, é sempre bom ter ao lado um bom dicionário. O Aurélio, de que me valia, dava conta do recado. Hoje uso o Houaiss Eletrônico, que veio facilitar nossa vida. Mas então já sabemos quem são os gladiadores: o que faziam e para quê.
A coisa empaca é com o segundo termo do título, porque “moderno”, o que seja, quando e onde, já rendeu toneladas de papel e tinta de discussão. Por exemplo, essa última oração não pode ser considerada moderna porque meu avô já a usava? Não, caro leitor, não vou entrar na discussão do que seja moderno, nem onde ou quando. Moderno, aqui e para o que nos interessa, vem com a acepção de contemporâneo, atual. Algum leitor mais atento e mais crítico dirá: por quê, então, já não usou um desses termos no título? Ora, e que maneira melhor teria o cronista para levantar um assunto que talvez nunca tivesse ocorrido a muitos leitores?
Os gladiadores contemporâneos (viu como dá?) lutam de maneira diferente e não é em uma arena. Ou seja, a arena, hoje, não tem arquibancadas, como naqueles antanhos romanos. Hoje se usa uma casa, com muito lazer, muita cama e um pouco de piscina. As roupas é que continuam semelhantes: quase nenhuma. E a arquibancada, nos dias que correm, é o sofá de sua casa. O público, ah o público, é o mesmo: quer ver sangue, como naqueles velhos tempos, aqueles tempos de Césares. Nem sempre por ferimento de ferro, como costumava ser. De qualquer forma, ou com qualquer espada, o sangue sempre fornece um belo espetáculo para as galerias, que se debruçam felizes sobre o espetáculo da morte, que é dos outros e não a própria.
Há algumas diferenças que não se podem esquecer: os vencidos não saem da atual arena degolados, de maca ou arrastados. Devem sair com algum dinheiro no bolso, ou na bolsa, e mesmo que pouco, é o suficiente para chegar a casa cheios de glória e viver folgadamente por um bom tempo.
"Os gladiadores atuais já vêm perdendo a popularidade". Foto: Storem/Flickr
Pois meus caros, os gladiadores atuais já vêm perdendo a popularidade. E isso em detrimento dos lucros de seus patrões. Em estudo recente encetado por meu amigo Adamastor, o anão, ele chega a várias conclusões. Uma delas, e a primeira, é que as asneiras não têm sido suficientemente asnáticas para encantar e educar nosso respeitável público. Propõe-se, como solução, que se consulte, lá no além, o Stanislaw Ponte Preta, aquele que organizou o FEBEAPÁ (Festival de besteiras que assola o país). Não que ele dissesse besteiras, mas ninguém como ele sabia onde elas se escondem.
Outra proposta é que o sexo seja menos explícito. Isso causaria um efeito de estranhamento e poderia atrair mais público.
Agora, se o canal de televisão que assola o país quiser mesmo bater todos os recordes (recorde, minha gente, palavra paroxítona, certo?) de público, tem de botar mais um pouco de sangue nas cenas. O público continua o mesmo. Lá se vão dois mil anos, mas continuamos os mesmos animais sedentos de sangue. Como é que até hoje ninguém, entre tantos gênios da televisão, teve a idéia de usar um paredão real, com tiros reais, ou facadas, tudo dependendo da vítima e do dia da semana? Morte por afogamento, por exemplo, jamais. É cruel e não derrama sangue.
Nada melhor do que uma degola ao vivo para alegrar nosso respeitável público.



economia ECONOMIA economia



Dieese ‘desmonta’ justificativas de bancos para manterem alto spread


São Paulo – Um estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-econômicos (Dieese) desmonta alguns dos principais argumentos dos bancos brasileiros para manterem spreads elevados na intermediação financeira.

No início deste mês, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), pressionada pelo governo federal, condicionara a queda do spread a uma série de medidas a serem tomadas pelo governo, como redução do compulsório e de impostos.

Como se sabe, a resistência durou pouco. Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, sob ordens do governo, cortaram os spreads, obrigando as instituições privadas a fazerem o mesmo para não perderem mercado – ainda que os benefícios permaneçam restritos a alguns pacotes de serviços e segmentos de clientes.

O que o estudo da subseção do Dieese no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região confirma agora, com base em dados do Banco Central (BC), é que o spread é alto no Brasil por conta das altas margens de lucro embutidas na taxa.

Em 2010, última pesquisa feita pelo BC, o spread era formado por 32,7% de margem líquida, 28,7% de inadimplência, 21,9% de impostos diretos, 12,6% de custo administrativo e 4,1% de despesas referentes ao compulsório, subsídio cruzado e fundo garantidor de crédito.

A alta margem de lucro embutida não é o único problema. “Alguns analistas dizem que é preciso reduzir o compulsório para cortar o spread, mas isso é um desvio de foco, porque o compulsório representa apenas quatro pontos do spread”, afirma o economista do Dieese Gustavo Cavarzan, um dos autores do trabalho.

Ele lembra ainda que está embutido no spread um custo administrativo de mais de 12 pontos percentuais, apesar de os bancos já obterem uma remuneração via tarifas de 130% do valor das despesas com pessoal.

Por fim, uma outra crítica do Dieese diz respeito à inadimplência cobrada via spread, que na verdade é uma estimativa, e não a “inadimplência real”. Isso sugere que em determinados períodos os bancos cobram um valor referente à taxa de inadimplência que, na verdade, poderia ser menor.

Antes da atual onda de corte nos spreads, os bancos brasileiros eram um ponto fora da curva no mundo, onde alguns países chegavam a ter “spreads negativos”. Em janeiro de 2012, enquanto a taxa média paga para aplicações financeiras no Brasil estava em 38% ao ano, a taxa média de captação era de 10,2% anuais, resultando em um spread de cerca de 27,8 pontos percentuais ao ano. 

Na Argentina, esse número estava em 3,39 pontos, no Chile, em 4,49, no México, em 3,82, na Colômbia, em 7,37, e na Bolívia, em 9,61. Agora, aguarda-se um novo estudo para confirmar se os spreads no Brasil convergem rumo a padrões normais.

Apesar das novidades, Cavarzan afirma que não acredita que os bancos do país deixarão de registrar lucros relativamente mais elevados do que em outros países. “Eles vão deixar de ganhar na margem, mas vão ganhar na escala,”, diz.

O mercado de crédito no país realmente tem um amplo potencial de crescimento. Enquanto por aqui o volume de crédito alcança patamares de 48% (metodologia do BC, em janeiro de 2012) ou 57% (metodologia do Banco Mundial, em 2010), esse número chega a 225% na Dinamarca, 169,2% no Japão, 145,5% na África do Sul e 130,0% na China - conforme dados do Banco Mundial.

Fonte: www.cartamaior.com.br 






POLÍTICA, MÍDIA


M Í D I A



OPINIÃO PÚBLICA, O QUE É?


por MINO CARTA,  na Revista CartaCapital










Confusões. O Estadão acredita que seu sonho de vê-los brigar é verdade. Foto: Pedro Ladeira/Frame/Ag. O Globo
Pergunto aos meus reflexivos botões qual seria no Brasil o significado de opinião pública. Logo garantem que não se chama Merval Pereira, ou Dora Kramer, ou Miriam Leitão. Etc. etc. São inúmeros os jornalistas nativos que falam em nome dela, a qual, no entanto, não deixa de ser misteriosa entidade, ou nem tão misteriosa, segundo os botões.
A questão se reveste de extraordinária complexidade. Até que ponto é pública a opinião de quem lê os editorialões, ou confia nas elucubrações de Veja? Digo, algo representativo do pensamento médio da nação em peso? Ocorre-me recordar Edmar Bacha, quando definia o País -como Belíndia, pouco de Bélgica, muito de Índia. À época, houve quem louvasse a inteligência do economista. Ao revisitá-la hoje, sinto a definição equivocada.
Os nossos privilegiados não se parecem com a maioria dos cidadãos belgas. A Bélgica vale-se da presença de uma burguesia autêntica, culta e naturalmente refinada. Trata-se de tetranetos da Revolução Francesa. Só para ser entendido pelos frequentadores do Shopping Cidade Jardim em São Paulo: não costumam levar garrafas de vinho célebre aos restaurantes, acondicionadas em bolsas de couro relampejante, para ter certeza de uma noite feliz. Até ontem, antes do jantar encharcavam-se em uísque.
Em contrapartida, a minoria indiana, sabe das coisas e leu os livros. Já a maioria, só se parece com a nossa apenas em certos índices de pobreza, relativa ou absoluta. No mais, é infelicitada por conflitos, até hoje insanáveis, étnicos e religiosos. Nada de Bélgica, tampouco de Índia. Nem por isso, a diferença, ainda brutal, existe entre brasileiros ricos e pobres, embora desde o governo Lula tenha aumentado o número de remediados.
O Brasil figura entre os primeiros na classificação da má distribuição de renda, pecha mundial. Na semana passada, CartaCapital publicou ampla reportagem de capa sobre vários índices do nosso atraso, a mostrar que crescimento não é desenvolvimento. De fato, o Brasil sempre teve largas condições de ser um paraíso terrestre, como vaticinava Americo Vespucci, e não foi porque faltou o comando de quem quisesse e soubesse chegar lá. Sobrou espaço para os predadores, ou seja, aqueles que, como dizia Raymundo Faoro, querem “um país de 20 milhões de habitantes e uma democracia sem povo”.
A opinião pública que os Mervais, Doras e Mirians da vida acreditam personificar, é no máximo, na melhor das hipóteses para eles, a dos seus leitores. Há outra, necessariamente, daqueles que não se abeberam a essas fontes, e muitos sequer têm acesso à escrita. Votam, contudo, e são convocados pelas pesquisas de opinião. À pressão midiática, que ignoram por completo, preferem optar por Lula e Dilma Rousseff. Temos de levar a sério esta específica e majoritária opinião pública claramente expressa e, em termos práticos, mais determinante que a outra.
A opinião pública que a mídia nativa pretende personificar já condenou o chamado mensalão e decidiu os destinos da CPI do Cachoeira. A opinião pública da maioria está noutra. O resultado do confronto há de ser procurado nas pesquisas e nas eleições, é o que soletram meus botões. Eles são exigentes e me forçam a um exame de consciência. Por que as circunstâncias me levam à referência frequente a mídia nativa? Acontece que a mídia é, sim, personificação da minoria. Aquela do deixa como está para ver como fica.
A mesma que conspirou contra Getúlio democraticamente eleito e contra a eleição de Juscelino. Ou que apoiou Jânio Quadros em 1960, tentou evitar Jango Goulart depois da renúncia e enfim implorou o golpe perpetrado pelos gendarmes fardados em 1964, e o golpe dentro do golpe em 1968. A mesma que desrespeitou o anseio popular por eleições diretas em 1984 e engendrou uma dita redemocratização, de todo patética, em 1985, e hoje ainda dá uma de galo no papel impresso e no vídeo. Será que a rapaziada se dá conta do que está a acontecer de verdade?
A mídia nativa, é fácil demonstrar, na sua certeza de representar a opinião pública do País todo pratica aquilo que definiria como jornalismo onírico. Neste mister, o Estadão de quinta 26 supera-se. Estampa na primeira página que a presidenta Dilma mente ao afirmar, ao cabo de um longo encontro com Lula em Brasília, a ausência de diferenças entre ela e seu mentor. A presidenta responde obviamente a uma pergunta e diz: “Não há diferenças entre nós e nunca haverá”. Então por que perguntam se estão certos de que seu sonho é a própria verdade?













Barões da Mídia fecham acordo contra a CPI

publicada sexta-feira, 27/04/2012 às 01:13 e atualizada sexta-feira, 27/04/2012 às 01:13
Do 247

Há exatamente uma semana, o 247 revelou com exclusividade que o executivo Fábio Barbosa, presidente do grupo Abril e ex-presidente da Febraban, foi a Brasília com uma missão: impedir a convocação do chefe Roberto Civita pela CPI sobre as atividades de Carlos Cachoeira. Jeitoso e muito querido em Brasília, Barbosa foi bem-sucedido, até agora. Dos mais de 170 requerimentos já apresentados, não constam o nome de Civita nem do jornalista Policarpo Júnior, ponto de ligação entre a revista Veja e o contraventor Carlos Cachoeira. O silêncio do PT em relação ao tema também impressiona.

Surgem, aos poucos, novas informações sobre o engavetamento da chamada “CPI da Veja” ou “CPI da mídia”. João Roberto Marinho, da Globo, fez chegar ao Palácio do Planalto a mensagem de que o governo seria retaliado se fossem convocados jornalistas ou empresários de comunicação. Otávio Frias Filho, da Folha de S. Paulo, também aderiu ao pacto de não agressão. E este grupo já tem até um representante na CPI. Trata-se do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ).

Na edição de hoje da Folha, há até uma nota emblemática na coluna Painel, da jornalista Vera Magalhães. Chama-se “Vacina” e diz o que segue abaixo:

“O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) vai argumentar na CPI, com base no artigo 207 do Código de Processo Penal, que é vedado o depoimento de testemunha que por ofício tenha de manter sigilo, como jornalistas. O PT tenta levar parte da mídia para o foco da investigação”.

O argumento de Miro Teixeira é o de que jornalistas não poderão ser forçados a quebrar o sigilo da fonte, uma garantia constitucional. Ocorre que este sigilo já foi quebrado pelas investigações da Polícia Federal, que revelaram mais de 200 ligações entre Policarpo Júnior e Carlos Cachoeira. Além disso, vários países discutem se o sigilo da fonte pode ser usado como biombo para a proteção de crimes, como a realização de grampos ilegais.

Inglaterra, um país livre

Pessoas que acompanham o caso de perto estão convencidas de que Civita e Policarpo só serão convocados se algum veículo da mídia tradicional decidir publicar detalhes do relacionamento entre Veja e Cachoeira. Avalia-se, nos grandes veículos, que a chamada blogosfera ainda não tem força suficiente para mover a opinião pública e pressionar os parlamentares. Talvez seja verdade, mas, dias atrás, a hashtag #vejabandida se tornou o assunto mais comentado do Twitter no mundo.

Um indício do pacto de não agressão diz respeito à forma como veículos tradicionais de comunicação noticiaram nesta manhã o depoimento de Rupert Murdoch, no parlamento inglês. Sim, Murdoch foi forçado a depor numa CPI na Inglaterra – não na Venezuela – para se explicar sobre a prática de grampos ilegais publicados pelo jornal News of the World. Nenhum jornalista, nem mesmo funcionário de Murdoch, levantou argumentos de um possível cerceamento à liberdade de expressão. Afinal, como todos sabem, a Inglaterra é um país livre.

O Brasil se vê hoje diante de uma encruzilhada: ou opta pela liberdade ou se submete ao coronelismo midiático.


Fonte: Blog do Rodrigo Vianna (O Escrevinhador)


POLÍTICA NACIONAL



P S D E M B


Izaías Almada
Enquanto a reforma política brasileira inspira a fantasia de inúmeros cidadãos e fica arquivada e esquecida em gavetas de Brasília, torna-se necessário, vez por outra, avaliarmos o quadro geral da República nessa área e nos debruçarmos sobre uma ou outra questão de inegável relevância.

Uma delas, em ano eleitoral, é a formação desse novo partido que, indicam as circunstâncias, se constituirá – mesmo diminuindo o número de seus representantes no Congresso a cada eleição – no arauto do atraso, profeta do passado, no exemplo da intolerância, no arrimo da imoralidade pública e privada. Trata-se do jovem Frankenstein dos nossos partidos, cujos remendos vão sendo costurados à medida que o país toma conhecimento da verdade sobre a grande conspiração entre bandidos da imprensa, bandidos do congresso nacional e bandidos de outras origens e atividades, também conhecidos por empresários de jogos ilegais.

Quando se pensa que chegamos ao fundo do poço da ignomínia e do deboche de honrados cidadãos, capazes que são de esticar a mão para dentro dos cofres públicos e recolhê-las para dentro dos próprios bolsos, os deuses da ética nos brindam com novas e patéticas novidades sobre o bloco dos bandidos do colarinho branco e de caráter bem sujo. Sobre o assunto, recomenda-se a leitura de “Privataria Tucana” e os relatórios da PF sobre a operação Monte Carlo.

Saber que há grupos e corporações embaralhando e dando as cartas no jogo político e econômico do capitalismo, no jogo do público e do privado, não é propriamente uma novidade. Que se disputa o poder político seja através de eleições democráticas ou mesmo de revoluções populares ou golpes de estado, consoante o interesse a ser contemplado ou imposto, também isso é tão antigo quanto o próprio sistema e a história do homem. Logo, não seria nada espantoso para a atual sociedade brasileira mais essa investigação da Polícia Federal que veio à tona nas últimas semanas. 

Contudo, ainda é possível a muitos de nós o sentimento de indignação ou, o que é pior, o amargor de nos sentirmos impotentes diante da pusilanimidade e do deboche com que certos políticos denigrem não só a sua própria imagem e a dos partidos que representam, mas – sobretudo – a natureza da atividade a que se dedicam como homens públicos e (na teoria, pelo menos) o de serem os guardiães dos princípios éticos e democráticos.

A ditadura de 64/68 criou dois partidos políticos artificiais, Arena e MDB, apenas para dar ao país e talvez ao mundo a fugaz impressão de que a troca de generais e a existência de um congresso com dois partidos ali representados espalhassem a sensação de sermos uma ‘ditabranda’, segundo o neologismo criado por algum sociólogo de botequim...

De lá para cá o país foi governado dentro da cartilha neoliberal e a tal Aliança Renovadora Nacional, antes de se tornar PFL e agora DEM, deitou e rolou sob a proteção da força militar, com a ajuda de uma imprensa subjugada ou defensora de seus próprios interesses e do interesse de seus grandes anunciantes, da cooptação sistemática de acadêmicos e intelectuais, da destruição das garantias dos trabalhadores, da escravização para o trabalho no campo, do sucateamento do ensino e da saúde, da privatização de empresas públicas, a tal ponto que a eleição de um operário metalúrgico e uma ex-guerrilheira, com milhões e milhões de votos nas urnas, mesmo que com grande empenho da parte deles, ainda não foi capaz de quebrar a espinha dorsal de tal domínio.

Entre 1964 e 2012, duas novas gerações de brasileiros passaram dos bancos escolares à direção de empresas, de alunos a professores, de eleitores de primeira viagem ao conjunto de novos governantes nos níveis municipais, estaduais e federais, de filhos a pais, de pais a avós, de indiferentes a participantes ou vice e versa, juntando-se todos aos mais velhos com a sua experiência adquirida no pós guerra para uma caminhada cheia de esperanças e frustrações. Todos, absolutamente todos, a se informarem e a formarem opiniões a partir de jornais, revistas semanais e canais de televisão, de cujos editais escorre o veneno da injúria, mata-se a reputação de adversários políticos e concorrentes nos negócios privados e, sobretudo, públicos.

Nessa caminhada sobrecarregada de decepções nos campos da política partidária, onde o que menos importa em muitos casos é o interesse do país; no exercício da justiça, cujo palco é manchado pela vaidade e até pela corrupção de juízes apequenados; na correção mais implacável das mazelas sociais, com um grau nada desprezível de sucateamento na educação formal; na luta pela soberania do país contra a eterna falácia dos entreguistas, e com as ideologias se baralhando, programas de governo se distanciando dos seus objetivos, políticos a mudarem de partidos, partidos a mudaram de nomes, o país a mudar de fisionomia, sendo que nos últimos nove anos – sob alguns bons aspectos – até para melhor, mas ainda assim sem a convicção de que se pode mudar mais e com mais verticalização e segurança.

Não obstante, pesados os prós e os contras, não podemos perder de vista a estratégia do adversário, quando ela existe e, sobretudo, a do inimigo. A cultura do dinheiro e do sucesso a qualquer custo, a competição selvagem como alavanca para o progresso e para o desenvolvimento, a eliminação paulatina dos conceitos éticos, a mentira e a falácia como armas de convencimento e difusão de idéias, continuam a ser o manancial onde se abastecem a esperteza de maus políticos, da imprensa venal e da justiça de classe, esse triunvirato de imenso poder corrosivo sobre uma sociedade que ainda não conseguiu se descolar inteiramente do seu passado de país escravagista, monocultor, aculturado e dependente.

A educação formal no Brasil ainda não foi capaz, apesar de inúmeras tentativas, de criar mecanismos que apetrechem o cidadão, desde os primeiros bancos escolares, a refletir e entender os direitos e deveres do convívio social, de maior respeito ao coletivo, aos direitos do outro, do combate cotidiano ao princípio de ‘tirar vantagem em tudo’ e até de aceitar a corrupção dos amigos e combater a dos adversários ou mesmo inimigos. A cultura do ‘farinha pouca meu pirão primeiro’... Ainda há um caminho a percorrer, difícil, cheio de armadilhas, que requer paciência e perseverança no dia a dia, nas semanas e meses que passam, inexoráveis. As eleições municipais de 2012 vão retomar esperanças e oferecer ao Brasil nova oportunidade de outro passo à frente, de outra batalha contra os que insistem em olhar para um país que quer abandonar o lado mais escuro do seu passado.

E se há um partido político que representa no Brasil de hoje não só uma visão de passado e de retrocesso político, a que devemos todos estar bem atentos para não retroagirmos nesse pouquinho de democracia conquistada, nos avanços na área econômica e na defesa de nossa soberania, esse partido que junta o reacionarismo conservador ao discurso da modernidade neoliberalizante, atende no momento pela obscena sigla de PSDEMB.

Escritor e dramaturgo. Autor da peça “Uma Questão de Imagem” (Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos) e do livro “Teatro de Arena: Uma Estética de Resistência”, Editora Boitempo.


Fonte: www.cartamaior.com.br 



O senador, a mídia e o 'grand finale'
da ópera



As relações naturalmente promíscuas entre membros do Congresso e a contravenção penal, só são uma novidade por terem se desvelado na atual conjuntura. No mais, que tudo tenha acontecido com um moralista de plantão, tido pela grande imprensa como o mais honesto dos congressistas, não chega a ser um enredo para novela de mau gosto. Somerset Maugham no seu conto "A Chuva" põe um pastor a ser flagrado numa relação mais que escandalosa com uma prostituta. Nada que seja pior do que o conluio entre o senador Demóstenes Torres e o contraventor Carlinhos Cachoeira. É que os enredos de novelas e de óperas, quando minimamente coerentes, podem ser inferiores à realidade. A tragédia da ópera "Carmen", de Bizet, baseado no romance homônimo de Prosper Merimée, não é que o protagonista se junta a um bando de contraventores -contrabandistas - para seguir a sua amada - mas o fato, mais que corriqueiro, de que, ao se tornar bandido, acaba também como um assassino. 

Não que os crimes que incluam políticos e contraventores estejam isentos de protagonizarem também mortes. O caso do prefeito Celso Daniel em Santo André prefigura a quantas mortes pode chegar o que, à primeira vista, seria um caso de corrupção, um "simples" caso de corrupção. A diferença para o episódio que gerou uma CPI parece residir na mediocridade de ambos os personagens do fato denunciado recentemente, ou, se quisermos, na sensaboria dos protagonistas. 

Na galeria de personagens literários brasileiros do século XIX, a convivência com o jogo do bicho não chegava a machucar ninguém. Mas não havia também qualquer proibição à prática. A contravenção, modernamente, considerada que tal, põe em relevo a mesma questão que se coloca para o caso dos tóxicos: quem nasceu primeiro, a oferta ou a demanda: o ovo ou a galinha? Um dos exemplos emblemáticos de Machado Assis - dos poucos em que ele assume diretamente uma questão política - se dá na sua peça "O Quase Ministro". O título já diz tudo, inclusive sobre a ironia do escritor. Mas a trama em si fala muito pouco para os nossos tempos: o que avulta é a ambição humana - nada de conchavos, tendo como pano de fundo o poder econômico. 

É claro que isso existia. O milagre de o Brasil ter se tornado uma única nação, parece não ter obedecido à lógica da distância da metrópole, como ocorreu na América Latina de fala espanhola. Não são poucos os historiadores que defendem a anterioridade da data da nossa independência; o Brasil teria se tornado um país desligado de Portugal, não em 1822, quando Dom Pedro I institucionalizou o que, de fato, já tinha acontecido em 1808. Ao dar ao Brasil o status de reino, Dom João VI sabia que o resto seria uma questão de tempo para os ajustes, como, de qualquer modo, aconteceu. Mas na América espanhola as diferenças e a lonjura da metrópole se fizeram consoante os interesses econômicos dos países europeus. A Inglaterra prescindiu de perder tempo com as possíveis dissidências brasileiras: um rei submisso à Coroa Britânica, como foi àquelas alturas com a monarquia portuguesa, era tudo que a Inglaterra queria depois da derrota de Napoleão.

Nada disso deve ter obstado as burlas, as grandes jogadas financeiras. A história do Brasil tem seus detratores e muitos historiadores sérios: falta, porém, contar o que só nos está sendo revelado agora, após o período militar -do qual aliás, só sabemos o que é público e notório - as torturas, a covardia de muitos, a coragem de outros - mas e a corrupção? Qual o custo real da Transamazônica, da ponte Rio-Niterói, de Itaipu, ou dos aeroportos como Viracopos, construídos justamente durante a ditadura? 

São questões em aberto. Na peça de Machado, ser ministro não importava tanto como hoje . Quem mandava era o império e suas tenazes que parecem terem se estendido até a República Velha. Jorge Street, único empresário paulista que aceitou as reivindicações da primeira greve laboral conhecida no Brasil e que se deu, em 1917, em São Paulo, foi exemplarmente punido por sua abertura em relação aos problemas sociais. Teve cortado seu crédito pelos banqueiros da época. Nenhum problema de corrupção, em princípio - mas seja qual for o nome que se dê às maquinações de empresários com o estado, contra uma classe social, como a dos trabalhadores, o poder do capital foi usado de forma a suprimir a voz discordante do meio empresarial. 

Ao que parece, porém, o tema da corrupção era menos importante - ou um assunto irrelevante perante o poder efetivo, real. Napoleão sempre tolerou que Talleyrand - pai "natural" do grande pintor Eugène Delacroix - surrupiasse onde pudesse: julgava-o mais útil como diplomata, do que condenável por seus procedimentos, digamos, nada heterodoxos em relação ao dinheiro público. 

No Brasil atual, por conta e risco - quem sabe - de "um deixa pra lá" muito comum e leniente com a corrupção- chegou-se, por fim, ao inaceitável. As próprias relações do senador com o bicheiro, parece só se terem tornado um assunto nacional por esses "imbroglios" da história, ou antes, uma submissão paradoxalmente, momentânea digamos, da polícia com o governo. Essa, parece, a razão da surpresa da grande imprensa com o fato. O banco dos réus ocupado pelo senador Demóstenes Torres deveria, segundo a lógica da mídia, estar sendo tomado por alguém do governo; ou de esquerda. As capas e manchetes foram sempre monopolizadas pelo senador como "paladino" da moralidade, e portanto, do sistema. Só um erro de percurso explica os acontecimentos. Daí, porém, a busca quase desesperada da mídia: ao que parece, é preciso encontrar fatos que incriminem o governo e seus aliados. 

É isso que parece fazer da história e da arte o que elas são (se é que as duas sejam, afinal, muito diferentes): troquem-se os nomes e o filme será, sem tirar nem pôr, igualzinho à novela; ou à ópera, mas principalmente à realidade. Esse, aliás, parece o consolo consabido - uma alimenta a outra. O difícil agora é que o enredo siga o ramerrã. E que quem tenha de responder pelo mal feito não seja o governo - mas a oposição. A ver a ópera e esperar o "grand finale".

Enio Squeff é artista plástico e jornalista.


Fonte: www.cartamaior.com.br 




AS VOLTAS QUE O MUNDO DÁ



BRASIL JÁ É O TERCEIRO MAIOR CREDOR DOS ESTADOS UNIDOS


Até agora, ninguém deu a notícia. Com 372 bilhões de dólares em reservas internacionais, o Brasil acaba de se converter, aplicando mais da metade delas em “treasuries”, no terceiro maior credor individual externo dos Estados Unidos, como pode ser visto na própria página oficial do tesouro norte-americano, cujo link publico abaixo. O acúmulo de reservas internacionais, cujo custo de carregamento tem caído em linha com a redução da taxa SELIC, serve para valorizar o dólar com relação ao real, favorecendo nossas exportações,e é, sobretudo, uma arma geopolítica, que mantêm em situação positiva a imagem do Brasil frente às agências internacionais de classificação de risco e em uma posição de força em organismos como o G-20, o Banco Mundial e o FMI.

Conheço empresários brasileiros de linha mais desenvolvimentista, no entanto, que pensam que a política de acúmulo de dólares poderia ser complementada com a emissão de moeda, no mercado interno, destinada a investimentos diretos do governo na área de infraestrutura, por exemplo. Tal medida, com uma pequena expansão administrável da inflação, derrubaria o valor do real frente ao dólar, favorecendo as exportações, injetaria dinheiro em todos os níveis da economia produtiva, e criaria milhões de empregos.


Mauro Santayana, em seu Blog.





A DECISÃO DO SUPREMO SOBRE A
CONSTITUCIONALIDADE DAS COTAS
RACIAIS

Pra quem não sabe, o STF julgou ação de inconstitucionalidade impetrada pelo DEM (pasmem, de
Democrata), sob o comando do catão Demóstenes Torres, com total apoio das Organizações
Globo, com a participação ativa de Ali Kamel, que escreveu um livro Não somos racistas,
na intenção de ser um novo Gilberto Freyre.




STF derrota a tese da guerra civil

por Luiz Carlos Azenha
Eu defendo as cotas raciais. Acredito que devam ser resultado de ações afirmativas adotadas no âmbito de cada instituição como, aliás, tem sido o caso no Brasil.
Respeito todos aqueles que argumentam contra as cotas, mas algumas das “teses”  defendidas por eles são claramente risíveis.
Uma delas é de que a implantação de cotas raciais no Brasil causaria uma guerra civil. Considerando o número de universidades que já adotaram as cotas, a essa altura a guerra civil já deveria ter estourado.
A ideia da explosão de uma guerra civil entre brancos e negros, por causa das cotas raciais, resulta da visão distorcida que alguns poucos  intelectuais têm da convivência entre os “de baixo”. Desconhecem os laços de solidariedade social e presumem, de forma um tanto elitista, que os brancos pobres não são capazes de reconhecer as injustiças históricas cometidas contra os negros.
É uma tese que desconhece, por conveniência, alguns fatos históricos, como o engajamento de centenas de milhares de brancos na luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Lá, sim, houve uma guerra — e não foi de negros contra brancos, mas de uma coalizão de negros e brancos contra o racismo oficial, institucional.
No Brasil, o argumento falacioso da guerra civil foi brandido, por exemplo, pelo todo-poderoso da TV Globo, Ali Kamel, numa discussão interna com o repórter Rodrigo Vianna. Talvez, aproveitando a decisão histórica do STF que considera as cotas constitucionais, seja o caso do Rodrigo contar de novo o caso. Rodrigo, àquela altura,  questionava a postura unilateral da Globo na cobertura do assunto.
A emissora fez campanha aberta e declarada contra as cotas, usando para isso o Jornal Nacional. Podemos dizer, sem medo de errar, que a emissora acabou mobilizando e aglutinando em torno de si os que se opunham às cotas, garantindo a eles visibilidade com o objetivo de convencer a opinião pública das teses gestadas no Jardim Botânico. Neste esforço se engajou o DEM, autor da ADIN que está em julgamento no STF.  Sim, sim, é mais uma demonstração da sintonia entre a emissora e  o partido de Demóstenes Torres. No que mais atuaram juntos? Nos bastidores do mensalão, por exemplo — como aliás, notou Marco Aurélio Mello?
A questão, portanto, vai muito além da implantação ou não das cotas raciais no Brasil, mas do uso de um bem público — o espectro eletromagnético — por uma empresa privada para promover suas teses junto à sociedade brasileira, de forma distorcida e unilateral.
PS do Viomundo: A propósito deste post, o Rodrigo Vianna esclareceu os detalhes da troca de mensagens a que me refiro acima.


Fonte: Blog do Luiz Carlos Azenha (Viomundo)







A terceira derrota de Ali Kamel: 10 x 0! Brasil vira a página do “racismo cordial”

publicada sexta-feira, 27/04/2012 às 00:39 e atualizada sexta-feira, 27/04/2012 às 09:39
Não somos racistas!
por Rodrigo Vianna
O Ali Kamel, diretor da Globo, levou uma sova no STF. Por 10 x 0 (dez votos a zero), o tribunal decidiu que são constitucionais - sim!!! – as quotas para negros nas universidades brasileiras.
Kamel, como se sabe, nega que haja racismo no Brasil. “Não somos racistas” é o título de um livro dele. Kamel é contra as quotas. E não está sozinho. Outros ideólogos contra as quotas são Demetrio Magnoli, ex-trotskista hoje especializado em dizer o que a Globo gosta de ouvir, e Demostenes Torres, amigo de sala e cozinha de Carlinhos Cachoeira.
Foi a terceira derrota acachapante sofrida por Ali Kamel em 6 anos. Em 2006, ele apostou tudo contra a reeleição de Lula. Eu trabalhava na Globo, e vi de perto todo o processo. A indignação seletiva nos telejornais, a forma como os aloprados eram sempre caracterizados como “do PT”, enquanto os tucanos eram tratados como “funcionários do governo anterior”, a forma como se escondeu o que havia no famoso dossiê contra Serra que os “aloprados” supostamente iriam comprar, a maneira como o “dinheiro dos aloprados” foi parar no JN na antevéspera do primeiro turno, a trama do delegado Bruno exposta pelo Azenha e depois pela CartaCapital… Tudo isso é história – que um dia precisa ser contada com mais detalhes.
O bombardeio da Globo contra Lula começara antes, em 2005, na cobertura do chamado Mensalão.O jornalista Marco Aurélio Mello escreveu um belo texto sobre isso. A Globo queria “sangrar Lula”, para derrotá-lo nas urnas em 2006. Aliou-se até ao pequeno ACM Neto. Não deu. Ali Kamel perdeu feio.
Em 2010, Ali Kamel pôs a Globo contra Dilma. Quem não se lembra do episódio da bolinha de papel? O perito Molina - que já atuara a favor de Kamel em causas pessoais do diretor da Globo no Judiciário – foi usado no JN para criar a teoria de que Serra fora atingido por um misterioso objeto. Só faltou acharem um Lee Osvald! A Globo passou ridículo. Serra virou Rojas. E Ali Kamel perdeu pela segunda vez.
A terceira derrota veio agora, no STF. “Ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última quimera”. Ninguém encampou a tese kameliana de que quotas seriam uma forma de “acirrar” as disputas raciais no Brasil. Demóstenes (recolhido à cozinha de Cachoeira) fez falta, porque era valoroso defensor dessa tese. Chegou a dizer, numa audiência pública, que o racismo não fora tão violento assim, e que a mistura entre negros e brancos se deu através de estupros cometidos pelos senhores, sim, mas que eram “consentidos” pelas escravas. Segundo ele, “uma história tão bonita de miscigenação”. Essa é a turma contra as quotas.
Ali Kamel é um pouco mais sutil. Mas também encampa teses estranhas: por exemplo, relativiza a cor da pele como elemento definidor da Escravidão no Brasil. Por que digo isso? Porque ele me falou sobre o tema numa troca de e-mails pessoal, em 2005.Eu cobrira, pela Globo, a visita a São Paulo de um enviado especial da ONU sobre racismo. A matéria não foi ao ar no JN. Kamel derrubou. Escrevi a ele no Rio, para saber o que acontecera. Trocamos e-mails de forma muito civilizada. E fiquei sabendo como ele pensava.
Já falei sobre isso numa entrevista a Marcelo Salles, mas sempre evitei dar detalhes dos e-mails, afinal a troca de mensagens se dera de forma reservada. Só que Ali Kamel não se importou com isso: usou os e-mails num processo judicial que move contra mim! Que deselegância! Usou para tentar provar que eu o tratava muito bem, e que depois passei a criticá-lo.
Sim, na troca de e-mails eu o tratei de forma cordial, como faço com todo mundo. Não tenho nada, absolutamente nada, contra ele pessoalmente. Nossas diferenças são políticas e jornalísticas, são formas diferentes de ver o mundo e de intervir no debate.
Desde o início do governo Lula, Ali Kamel se posicionou contra o Bolsa-Família (“assistencialista”, o certo era investir em educação),  contra o Prouni, contra as quotas (afinal, se “não somos racistas”, pra que quotas?).
Por isso, essa terceira derrota de Ali Kamel, no STF, deve ter sido a mais dolorosa. “Ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última quimera”. Não apareceu ninguém para defender a “sociologia kameliana” no STF. Ele levou uma surra.
Nos e-mails de 2005, com alguma arrogância, tentou ensinar-me quem era Gilberto Freyre. Ali Kamel provavelmente acredite que é o novo Freyre, o novo formulador da “democracia racial” brasileira. Um Freyre incompetente. Porque mesmo entricheirado na emissora mais poderosa da América Latina, ele perde todas. Perde o debate no STF, perde as eleições, perde a capacidade de influir nas decisões do Estado brasileiro. Um bom sinal.


Fonte: Blog do Rodrigo Vianna (O Escrevinhador)