31 julho 2014

CAOS ECONÔMICO LUCRATIVO

No Brasil da direita, a culpa é da vítima


Fernando Brito, no TIJOLAÇO



caos
Aécio Neves diz que o Aeroporto de Cláudio só é usado por ele porque a ANAC não o homologou, mesmo que isso tenha ocorrido por falta de documentos e porque a pista fica sob o controle de sua família.
Reinaldo Azevedo escreve que o racionamento de água em São Paulo vai  ocorrer por causa de Alexandre Padilha e do Ministério Público Federal, embora quem o diga necessário sejam os especialistas da Unicamp.
O Santander lucra aqui R$ 1,2 bilhão (líquidos, já sem os impostos que quase não pagam) em seis meses, quase 30% do que ganha em todo o mundo, mas se acha no direito de dizer que o Brasil vai de mal a pior.
Só de abril a junho, o Santander no Brasil teve lucro líquido de R$ 527,5 milhões no segundo trimestre, alta de 5,35% em relação ao mesmo período do ano passado.
A coisa anda “tão ruim” para os bancos que o Bradesco divulgou hoje um lucro líquido  de R$ 3,8 bilhões no 2° trimestre, quase 30% maior que o do ano passado. E sem emprestar mais, o que deveria ser a origem dos lucros de um banco.
A Argentina vinha pagando religiosamente sua dívida, mas um juiz de bairro decide que os que especularam com seus títulos, os fundos abutres, devem ter prioridade para receber o fruto de sua esperteza. E, em lugar de uma indignação contra isso, dizem que Cristina Kirchner “dá o calote” nos credores.
As empresas se queixam da demanda fraca mas contabilizam lucros recordes “vendendo menos”.
Estão todos “indignados”, os pobres coitados.
E nada disso é polemizado, porque são verdades absolutas, imperiais.
Reproduzo aí em cima um trecho da homepage do Valor Econômico.
Nunca se viu um caos econômico tão lucrativo assim.
 
 

MÁS COMPANHIAS

Dilma e o Santander


Dilma e presidente do Santander
 
por Mauro Santayana, em seu blog
 
 
(Hoje em Dia) – Diz a sabedoria popular que frango que acompanha pato acaba morrendo afogado. Sempre estranhamos, ao longo dos últimos governos, a excessiva atenção reservada, pela classe política brasileira, para o que existe de pior no empresariado ibérico, em especial o oriundo da Espanha a partir dos anos 90.
 
Criou-se em nosso país, com a entrada de Madrid no Euro, a ilusão de que a Espanha, que passou a maior parte do século XX mergulhada em uma ditadura medieval e agrária, tivesse sido – pela simples troca da peseta por uma moeda mais valorizada – subitamente alçada ao desenvolvimento.
 
Nos séculos XIX e XX, em processo que vinha se consolidando desde a derrocada de sua Invencível Armada, Madrid viveu à sombra da Inglaterra e dos EUA, que se apossaram do que restou de seu império, na Guerra Hispano-Americana de 1898.
 
De Cervantes a Picasso, a Espanha deu grande contribuição ao mundo. Mas nunca foi o paradigma de empreendedorismo e de pujança com que aportou por aqui à época do PROER e das grandes privatizações.
 
Desde 2008, pelo menos, sabe-se que a “fortaleza” ibérica estava baseada em bilhões de euros em ajuda dos fundos da Comunidade Europeia e em centenas de bilhões de euros em dívidas, que deixaram em seu rastro um desemprego de quase 30%, e milhares de famílias despejadas e de aposentados prejudicados pelos bancos.
 
Quando se fala no IDH espanhol, é preciso lembrar que, por trás dele, está uma das maiores dívidas per capita do mundo. E que, se não fosse o hábito de exportar seus problemas e seus desempregados para países como o nosso, a cada duas gerações, os espanhóis não teriam o padrão de vida que tiveram até alguns anos atrás.
 
Na época em que, na América Latina, havia maioria de governos neoliberais, os “empresários” espanhóis eram recebidos, por aqui, como nababos.
 
E, o que é pior, continuaram a ter direito aos mesmos rapapés, depois da crise, quando suas ”grandes” empresas, altamente endividadas, começaram a depender, como de água para um peixe no deserto, dos altíssimos lucros auferidos em território brasileiro.
 
Sempre nos surpreendeu – e sobre isso escrevemos antes – o número de vezes em que o Senhor Emilio Botín – investigado, no passado, em seu país e execrado por boa parte da população espanhola – foi recebido em Palácio pela Presidente Dilma.
 
Nunca é conveniente que um presidente da República receba pessoalmente homens de negócio, e muito menos se forem estrangeiros. Para isso existem os ministros, como o da Indústria e Comércio ou o da Fazenda, por exemplo.
 
Se tivesse evitado os sorrisos e as fotografias que propiciou ao dono do Santander, por tantas vezes, com certeza a Presidente Dilma estaria se sentindo, agora, menos constrangida – depois da carta desse banco a “investidores”, desancando a orientação e as expectativas econômicas de seu governo.
 
 
 

RECEITAS GENÉRICAS

O que é de (des)conhecimento geral


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa




Os jornais reproduzem, nesta quinta-feira (31/7), trechos de declarações da presidente da República e dos seus dois oponentes mais destacados nas pesquisas de intenção de voto. Foi o primeiro grande evento da campanha eleitoral, sob a forma de uma sabatina promovida pela Confederação Nacional da Indústria em Brasília.
Como não poderia deixar de ser, quase tudo girou em torno da economia, mas o contexto das questões abordadas revela que, mesmo nos assuntos mais recorrentes, a imprensa não consegue sair da superfície.
O núcleo do debate que não aconteceu, porque a presidente e os dois candidatos oposicionistas se apresentaram separadamente diante dos representantes da indústria, foi a questão da reforma tributária. Trata-se de um desses mitos que se apresentam em nove entre dez discussões sobre economia no Brasil, sem que se conheça uma proposta capaz de reunir meia dúzia de adeptos.
Junto com a questão dos tributos, embarcou clandestinamente no debate o boato, estimulado nas redes sociais, de que, se reeleita, a presidente Dilma Rousseff iria promover um "tarifaço" geral.
Sobre a reforma tributária, candidatos a qualquer coisa costumam navegar nos ventos de uma percepção geral de que o sistema brasileiro é ineficiente, afeta a competividade das empresas nacionais e desestimula investimentos produtivos no País. Raramente se acrescenta ao debate a observação de que os tributos são também injustos, porque pesam proporcionalmente mais, muito mais, sobre o orçamento dos mais pobres.
O mantra da reforma, repetido exaustivamente pela imprensa, costuma esconder um dos seus pontos mais perversos: o sistema tributário como causa de desigualdade.
Numa sabatina promovida por industriais com os candidatos ao Planalto não se esperava ouvir, por exemplo, referências à taxação de grandes fortunas. Para o senso comum dos debatedores, com amplo suporte da imprensa, basta o Imposto de Renda para estabelecer a equanimidade entre os cidadãos.
Mas há entre os brasileiros aqueles que recebem a contrapartida de serviços mantidos pelos impostos e a outra parte, que fica ao relento.
Receitas genéricas
Outra questão que frequentou a discussão com os candidatos foi o tamanho do Estado, mais um tema cuja complexidade costuma ficar dissimulada sob a poeira do senso comum.
Provavelmente a mesma proporção de nove entre dez brasileiros entende que deveria haver um enxugamento da estrutura do Estado, mas nenhum dos participantes do seminário foi capaz de apontar que Ministério, que órgão público, deveria ser extinto.
Se o leitor levar adiante sua observação crítica, verá que, em praticamente todas as questões consideradas relevantes, a imprensa constrói discursos homogêneos e superficiais. Assim, desenvolveu-se no Brasil um cabedal de conhecimento sobre tudo que, na verdade, é formado por um emaranhado de desinformações. Desde a questão da reforma tributária até problemas distantes da economia, como a idade adequada para a responsabilização penal, tudo é discutido na planura dos lugares-comuns.
O Brasil vive, há muitos anos, um processo de empobrecimento intelectual patrocinado pelos principais meios de comunicação. O ambiente comunicacional organizado e pautado pela mídia tradicional é o reino das obviedades, terreno fértil para o populismo e a manipulação. Nesse território se edificam não apenas as carreiras políticas inexplicáveis, como algumas fortunas que desafiam as teorias de sustentabilidade do capitalismo.
Parte dos conflitos que vimos crescer nas ruas a partir de junho de 2013 tem origem nessa incapacidade das instituições de aprofundar a compreensão do Brasil contemporâneo.
Presos a essa roda de ignorâncias por aceitarem a dependência de um sistema de mídia limitador e intelectualmente modesto, governantes que deveriam tomar a iniciativa da mudança não se mostram capazes de inovar. Os candidatos ao cargo mais elevado do sistema de poder, colocados diante da oportunidade de expor o que se espera sejam ideias inovadoras, repetem velhas receitas genéricas.
A imprensa compra qualquer coisa e repassa ao público o que é o desconhecimento geral do Brasil sobre si mesmo.
 
 
 

GAZA: OS TÚNEIS DA MENTIRA

Janio de Freitas 
Espaço vital e mortal

Destruir por bombardeio a única usina de energia elétrica em Gaza não é procurar e destruir túneis dos combatentes palestinos. É o modo escolhido de causar o dano mais geral à população civil e às instalações essenciais que são os hospitais e postos de socorro ao que reste de vida nas vítimas das bombas, do canhoneio naval e dos tiros de tanques. Crime de guerra, pela Convenção de Genebra, e crime contra a humanidade, pelos princípios da ONU e pelas leis internacionais.

Os túneis como motivo dos ataques são apenas uma mentira a mais. O sistema de informação e vigilância de Israel não seria enganado, enquanto o Hamas construiria rede subterrânea tão extensa e sofisticada quanto diz o governo israelense. Mentira como a velha alegação de que os hospitais, escolas, mesquitas e moradias destruídos serviam de depósitos de armas e munição do Hamas. Se fossem, o ataque a tanto material explosivo teria levado toda Gaza pelos ares há muito tempo. Em vez disso, ruínas e crateras documentadas são compatíveis com o efeito normal dos bombardeios, sem a expansão de paióis explodidos.

O objetivo não são os túneis. Nem o foram os lançadores de foguetes do Hamas, como alegado ao início do atual ataque. O objetivo que pode explicar tamanho massacre é outro. Tem nome, já foi assunto de interesse da imprensa na Europa há uns 30 anos, mas veio a ficar cercado por um silêncio raras vezes transposto. O mesmo silêncio útil, e em grande parte pelas mesmas razões, adotado no último dia 24, quinta-feira.

Uma posse presidencial não é fato que passe sem se fazer notar. Tanto mais se quem deixa o posto é o último estadista de Israel, que se despede da vida pública aos 90 anos, e Nobel da Paz há exatos 20 anos. Foi diante de poucos convidados, no entanto, que Shimon Peres entregou a Presidência a Reuven Rivlin, que fez carreira como advogado de árabes moradores no território israelense. Sem que a atividade profissional tenha qualquer significado político.

O novo presidente de Israel não é apenas de ultradireita, integrante do mesmo Likud do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu. Ex-oficial de informação do Exército, Reuven Rivlin defende e incentiva a multiplicação de bairros ("assentamentos") israelenses em terras da Cisjordânia. Combate a hipótese do Estado Palestino previsto no ato de criação de Israel pela ONU. Em último caso, diz, seria admissível conceder aos árabes da Cisjordânia a cidadania de israelenses.

Reuven Rivlin é entusiasta e propagador do plano Grande Israel, hoje raramente citado, ao menos de público. Projeto que se origina (ou termina) em ideia semelhante à do "espaço vital" que figurou nas causas da Segunda Guerra Mundial. Nele se vê a explicação para os continuados "assentamentos", apesar da condenação da ONU e do poder conflituoso que têm, além de serem obstáculo central nos arremedos de diálogo de paz entre Israel e Cisjordânia.

Com o cadastro de Reuven Rivlin, o realce à sua posse tenderia a agravar a imagem de Israel propagada por sua ferocidade bélica. Mas a importância da ligação ostensiva do novo presidente com o plano Grande Israel não é só um prenúncio de sua ação futura. É componente lógico de um plano de ação que está muito acima dos túneis. E é levado pelas bombas à terra necessária à grandeza sonhada.
 
 
(Extraído do ESQUERDOPATA)
 
 
 

29 julho 2014

SITUAÇÃO RIDÍCULA

A mídia das manchetes ululantes

Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa




Os jornais requentam nas edições de terça-feira (29/7) a polêmica causada pela incursão do banco Santander na campanha eleitoral, ao selecionar declarações feitas pela presidente Dilma Rousseff durante sabatina organizada no Palácio da Alvorada pela Folha de S. Paulo, UOL, SBT e rádio Jovem Pan. Com isso, os leitores têm a oportunidade de refletir mais friamente sobre o comunicado em que o setor de análise de investimentos do banco espanhol recomenda explicitamente a seus clientes brasileiros de alta renda que votem contra a reeleição da presidente.
O episódio tem sido comparado a uma manifestação feita em junho de 2002 pelo magnata americano George Soros, de origem húngara, que previu o caos na economia brasileira caso José Serra não fosse eleito presidente, contra Lula da Silva, do PT. O megainvestidor verbalizou certa convicção que corria no mercado, segundo a qual, se eleito, Lula iria dar o calote na dívida externa e o Brasil deixaria de honrar seus títulos.
Operadores da campanha de Serra espalharam o veneno do pessimismo, e rapidamente a profecia se autorrealizou, trazendo grandes prejuízos à economia nacional. Entre junho e dezembro daquele ano, o câmbio disparou do patamar de R$ 2,63 para R$ 3,55; os juros básicos subiram de 18,5% para 25%, e a inflação mensal foi multiplicada por quase 15 vezes no decorrer do semestre, com o índice anual chegando próximo de 11% em novembro.
Com a posse de Lula e a desconstrução da teoria do apocalipse, o mercado se acomodou e os indicadores voltaram ao seu leito natural.
Análises pessimistas já circulavam com intensidade, por conta da deterioração dos indicadores econômicos no final do governo Fernando Henrique, antes que a Folha de S.Paulo entrevistasse o megainvestidor. A declaração de George Soros apenas consolidou especulações esparsas que aumentavam a volatilidade do mercado e agravavam as dificuldades do governo para manter o controle; mas certamente a imprensa ajudou a espalhar o caos, ao publicar a previsão de George Soros sem oferecer com o mesmo destaque a contrapartida de uma análise mais ponderada.
A fonte de todo saber
A imprensa nunca apresentou aos seus leitores o custo desse episódio, que configurou uma verdadeira conspiração contra os interesses do país, e hoje, como ontem, é de se questionar por que motivo os jornais dão curso às projeções pessimistas com indisfarçável regozijo, em manchetes ululantes.
Se, em 2002, a profecia alarmista de George Soros servia ao propósito da imprensa de interferir na disputa eleitoral em favor de José Serra e contra Lula da Silva, em 2014 a manifestação dos analistas do banco Santander não produz o mesmo efeito.
Qual seria a razão dessa mudança?
Um dos motivos é certamente o fato de que, em doze anos de uma política econômica com mais preocupação social, o Brasil melhorou, a pobreza entrou em queda, a desigualdade foi reduzida e houve uma melhora geral na percepção de bem-estar. Portanto, há um contexto social menos vulnerável a pregações pessimistas, embora persistam circunstâncias preocupantes, como as oscilações de preços e a deterioração histórica da indústria nacional.
Por outro lado, o chamado mercado se tornou mais complexo, e aquele núcleo onde atuam os especuladores não produtivos reduziu-se em relação ao conjunto das movimentações financeiras, enquanto novas fontes de financiamento diversificam os meios de capitalização das empresas.
Mas pode-se acrescentar a esses fatores a queda na credibilidade da mídia tradicional: uma manchete de jornal já não tem o mesmo poder de influência que tinha há pouco mais de uma década, e quem toma decisões financeiras importantes faz uma leitura mais crítica das notícias.
A análise dos consultores do Santander coincide com o que pensam a direção do banco, os especuladores e a imprensa hegemônica. Mas há uma realidade a ser considerada, e ela conta que as instituições financeiras ganharam muito dinheiro com a política econômica baseada no aumento da renda das classes médias.
A maneira atabalhoada com que o presidente do Santander veio a público desfazer o mal-estar apenas escancara a situação ridícula em que se coloca a imprensa ao fazer do mercado a fonte de toda sabedoria.
 
 
 

LUTAR PODE SER CRIME, SIM

Janio de Freitas 
Cobrança de devedores

As ameaças dos "ativistas" aos fotógrafos, cinegrafistas e repórteres --"Lutar não é crime / Vocês vão nos pagar"--, berradas em coro dentro do próprio Sindicato dos Jornalistas do Rio, são um equívoco duplo e denunciador de inequívoca obtusidade política. Mas não só.

Lutar pode ser crime, sim, a depender da luta. Lançar um rojão contra um cinegrafista de costas, levando-o à morte, não é lutar. É covardia mortal. Como também é só covardia criminosa, embora, por sorte, não letal, derrubar e ferir um cinegrafista que apenas procurava captar a liberação dos presos por violências apelidadas de "manifestações".

É quase engraçado que os adeptos da violência inútil estejam tomados de ódio aos jornalistas. Tivessem um mínimo de percepção, deveriam exibir-lhes muita gratidão. Na obtusidade da sua ira, ainda não perceberam que devem a jornalistas a sua integridade física, se é que muitos não devem a vida.

Não fossem os cinegrafistas, os fotógrafos e os repórteres que se expõem no testemunho das arruaças, não haveria o clamor das reportagens e artigos que pressionam e convencem os responsáveis pela atividade polícia a conter, desarmar e até sacrificar os métodos e, é preciso dizê-lo, as obrigações repressoras requeridas pela segurança pública.

No Rio e em São Paulo, é muito evidente o esforço das Secretarias de Segurança por uma nova conduta policial, por educar o agente de segurança para os confrontos sem exorbitâncias. Os beneficiários desse avanço não são os jornalistas que os cobraram, inclusive pela exibição de arbitrariedades policiais. São os manifestantes arruaceiros, os grevistas agressivos e os direitos humanos.

Até mamãe Sininho acusa os jornalistas de tornarem "um inferno a vida" da filhota Sininho. Mas não foram os jornalistas que frustraram o plano de incendiar a Câmara Municipal do Rio. Têm dado tratamento até muito camarada às pessoas e investigações das violências passadas e pretendidas. Para percebê-lo, é suficiente imaginar o tratamento aos mesmos fatos e gravações com personagens de outra classe social.

Por falar em gravações: ainda que a polícia tenha "plantado as bombas encontradas", como dizem as defesas, as vozes e diálogos gravados não foram plantados. E também não foram gravados por jornalistas.
 
 
(Extraído do ESQUERDOPATA)
 
 
 

28 julho 2014

JORNALISMO E BOBAGENS

Por que o tiro saiu pela culatra


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa



Cautelosamente, os jornais brasileiros começam a interpretar o quadro mais amplo das pesquisas de intenção de voto, colocando em perspectiva alguns fatos que foram vinculados recentemente às escolhas do eleitorado. Manifesta-se na imprensa uma necessidade de entender por que razão a vantagem da presidente Dilma Rousseff sobre seus principais adversários se mantém praticamente incólume, contrariando as expectativas criadas pela maioria dos analistas a cada rodada de consultas.
A pergunta por trás desse esforço é a seguinte: como é que ela continua na liderança, com grande potencial para vencer no primeiro turno, se quase tudo que se noticiou ao longo dos últimos meses deveria ter induzido a uma queda na sua aprovação?
Uma das respostas vem junto com a própria pergunta: quanto mais se fala de um candidato, mais conhecido ele se torna. Se o cidadão não enxergar uma grande diferença entre eles, e se a situação geral não produz um desejo massivo e radical de mudanças, a tendência é que o nome mais conhecido acabe se consolidando na mente dos eleitores.
Ainda que predomine nos principais jornais do país um viés negativo na abordagem dos assuntos mais relevantes sempre que se referem ao governo de Dilma Rousseff, é preciso considerar, ao mesmo tempo, que os tradicionais mediadores da comunicação social se tornam menos influentes quanto mais cresce o uso das mídias digitais. É legítimo considerar, portanto, que a mensagem centralizada das mídias tradicionais tem se tornado marginal no amplo sistema de informações da sociedade hipermediada.
Uma análise interessante sobre o assunto foi produzida pelo colunista José Roberto de Toledo, publicada na edição de segunda-feira (28/7) do Estado de S.Paulo. Ele observa que um terço dos eleitores vivem em domicílios beneficiados por algum programa social do governo federal, mas a escolha da presidente pelas famílias que não recebem nenhuma bolsa ou auxílio é quase igual, em termos proporcionais, o que o faz concluir que o apoio a Dilma Rousseff vem de uma aprovação geral à política social por parte da população como um todo.
Jornalismo e bobagens
Por outro lado, pode-se acrescentar à análise do colunista outras visões sobre o noticiário e seu esperado efeito nas escolhas dos eleitores. Por exemplo, se formos considerar a versão pessimista que a imprensa vem apresentando sobre a situação econômica do país, teremos que confrontar esse viés com a percepção da sociedade sobre sua própria circunstância e relativizar a influência da imprensa.
Os indicadores de confiança e otimismo mostrados pelas pesquisas não confirmam a expectativa criada pelos jornais – o que indica, claramente, que a maioria da população discorda da visão homogênea da imprensa. Não é difícil constatar que esse viés do jornalismo brasileiro não se constrói com um olhar amplo sobre a economia como um todo: o noticiário econômico da imprensa nacional se faz com a perspectiva de uma minoria, exatamente o mesmo público visado pelo desastrado comentário divulgado recentemente por analistas do banco Santander.
O comunicado oficial do banco espanhol, condicionando lucros futuros de investidores a uma eventual queda das intenções de voto na presidente Dilma Rousseff, representa um microcosmo do ideário que predomina na imprensa.
Os jornais genéricos não escrevem para a sociedade, mas para um pequeno conjunto de investidores, de renda mais alta mas não necessariamente vinculados a atividades produtivas. As editorias de economia e negócios do Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo e o Globo destoam, escancaradamente, daquilo que apresentam os diários especializados, como o Valor Econômico e o DCI, que costumam abordar as questões econômicas de maneira mais ampla e equilibrada.
Observe-se, por exemplo, a reportagem publicada no sábado (26/7) pelo Estado, com título destacado ao lado da manchete: “Petrobras amplia gastos em publicidade em meio a crise”. A reportagem não resiste a um questionamento básico: praticamente todas as grandes empresas concentraram os investimentos publicitários no primeiro semestre, por causa da Copa do Mundo. A Petrobras tem mais razões para isso, porque sua publicidade fica limitada durante o período eleitoral.
Bobagens como essa explicam, em parte, por que o noticiário negativo não afeta a grande massa de eleitores.
 
 
 

OS PROBLEMAS DO AÉCIO

Aécioporto: Escândalo fez Aécio cair em pleno voo

Antonio Lassance

A denúncia do aeroporto construído na fazenda que pertencia ao tio de Aécio Neves, com dinheiro público, fez um estrago maior do que o esperado pelo candidato e sua coordenação de campanha.

A equipe responsável pela campanha já tem sinais claros de que a denúncia "pegou" - ou seja, ganhou grande repercussão entre os eleitores mais informados sobre política e já virou o assunto principal associado ao candidato. 

Os sinais foram colhidos em pesquisas internas, tanto telefônicas quanto de análise da repercussão em redes sociais.

A péssima notícia virou um grande problema para a campanha oposicionista e deixou seu comando, a começar do próprio Aécio, indeciso sobre o que fazer, de agora em diante.

Até o momento, a tática era a de fugir do assunto o máximo possível. 

Pensava-se, de início, que o ideal seria não comentá-la para não dar mais "asas" ao assunto, e diminuir o risco de "o aeroporto do tio de Aécio" - que é como o assunto tem se popularizado - colar ainda mais na imagem do candidato.

Os dados colhidos da percepção dos eleitores mostram que isso já não funciona mais. Pior: pode já estar surtindo efeito contrário.

Quando foi pego de surpresa, Aécio deu declarações que, logo em seguida, foram desmentidas por outras reportagens.

Nos dias seguintes, se calou sobre o caso. Ontem, ao ser perguntado por jornalistas a respeito, Aécio simplesmente recusou-se a responder.

De agora em diante, a postura só ajuda a consolidar a convicção, entre muitos eleitores, de que o candidato está "metido em corrupção" - para usar uma frase comum surgida nas respostas da pesquisa telefônica.

A postura de criticar as investigações da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e do Ministério Público pode piorar o quadro ainda mais, pois deve reforçar a crítica de que se tenta esconder sujeira debaixo do tapete.

Pesquisas internas, como as telefônicas, servem apenas como um recurso rápido para analisar o tamanho da repercussão que um assunto ganha na campanha e calibrar a dose da resposta a ser dada.

Quando se responde a algo com baixo interesse na opinião pública, comete-se o erro de dar importância maior do que se deve, patrocinando notícia negativa.

Por outro lado, minimizar ou fugir de um assunto considerado muito grave por uma grande parcela da opinião pública acarreta um prejuízo bem maior. É o que, entre os profissionais da comunicação, se conhece como tática do avestruz.

A campanha de Aécio já espera por uma queda em suas intenções de voto, a ser aferida nas próximas rodadas, a partir de agosto.

Agora começa a fase na qual a divulgação do escândalo começa a chegar no boca a boca da campanha com mais força.

Doravante, se Aécio for pousar na pista do seu agora muito conhecido aeroporto, escondidinho na cidade de Cláudio, interior de Minas Gerais, é bom pedir ao comandante para avisar: "atenção, torre de controle. Temos um problema!"

(*) Antonio Lassance é cientista político.

Charge: Ipojuca


(Extraído do ESQUERDOPATA)


 


O EMBATE ENTRE ESQUERDA E DIREITA

A direita teme o Estado


Maurício Dias, na Revista CartaCapital




Quem não se lembra da frase de George Soros, dita em 2002 e retransmitida pela mídia brasileira, “em cadeia nacional”, de que a vitória de Lula “seria o caos”?
Era a mão visível do mercado pregando o terrorismo.
Em 2014, a coisa não está tão longe disso. O ex-funcionário de Soros e ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, apontado como czar da economia se Aécio ganhar a eleição, chegou a afirmar que “a possibilidade” de Dilma vencer no primeiro turno “poderia ter o mesmo efeito que a vitória de Lula em 2002”.
Naquele ano, o dólar, premeditadamente, foi empurrado para a porta dos 4 reais e ameaçava a estabilidade econômica. Hoje, após transitar por gabinetes refinados no universo empresarial e político, eis o que pensa Fraga, interpretado por jornalistas sintonizados com os interesses conservadores, já prontos a descartar o desfecho da eleição no primeiro turno.

“A derrota do PT no segundo turno poderia fazer a Bolsa de Valores retomar o crescimento depois de ter caído quase 40% nos anos Dilma.”
Dilma significaria o caos, ou quase. Provaria isso o efeito do empate técnico, no segundo turno, projetado pelo resultado da pesquisa DataFolha mais recente. Conhecidos os porcentuais, o Ibovespa subiu “empurrado pelas ações das estatais”.
Aqui o argumento econômico não encobre mais o conteúdo político. Esse é o conflito do “lobo mau” (o Estado) com a “raposa” (o mercado), que, como se sabe, não pode ficar sozinha no galinheiro.
Não por acaso este início de disputa eleitoral mostra uma mudança no discurso da oposição. Inicialmente, Aécio cresceu quando passou a disparar contra o PT. Valeu-se da pauta de acusações que norteia os tucanos. Agora, para driblar o difícil conflito de programas administrativos, pelos quais Dilma leva vantagem, os tucanos se aproximam do terrorismo econômico para conter a influência do Estado.
O medo produz o pesadelo. Teme-se o avanço estatal se o governo continuar sob controle de Dilma. Isso expõe, com falsa razão, o contágio ideológico.
É verdade e não se trata de segredo que o Estado, no governo Dilma, tem função importante na condução das políticas de governo exatamente onde o mercado falha ou não investe por dúvidas sobre o retorno lucrativo.
Essa é a verdadeira moldura do debate da eleição de 2014.
Em dois meses, arredondando os dias, os brasileiros vão escolher quem os governará por mais quatro anos, a partir de 2015. E já não há dúvida, salvo uma mudança sobrenatural, que a disputa será mais uma vez entre petistas e tucanos. Eduardo Campos (PSB) está fora. Faz apenas o papel de coadjuvante.
O PSDB comandou o país por oito anos com Fernando Henrique Cardoso. O PT vai completar 12 anos de poder, contando os oito anos de Lula e os quatro de Dilma.
Essa é uma luta política encarniçada e vai muito além de rivalidades pessoais passadas, entre os dois ex-presidentes ou entre os atuais postulantes ao cargo. No caso de Dilma, o segundo mandato. A competição busca o poder. Expõe diferenças programáticas e consolida o embate, que não foi expulso da história, entre a direita e a esquerda.
 
 
 

FALTA COMUNICAÇÃO





É a mídia, Dilma, é a mídia


Emir Sader, na Agência Carta Maior



Uma política de comunicações desastrosa por parte do governo é responsável por esse clima que coloca em risco a continuidade do projeto democrático e popular.

Qualquer comparação minimamente objetiva dos governos tucanos e petistas – dos candidatos que representam a um e a outro – permitiriam prever uma vitória eleitoral ainda mais fácil do governo neste ano. Ninguem duvida dos resultados dessa comparação, ainda mais que o candidato tucano reivindica a mesma equipe econômica de FHC e seu gurú  econômico repete os mesmos dogmas que levaram os tucanos a nunca mais ganharem eleição nacional no Brasil depois que essa equipe governou o pais. Enquanto a candidata do governo representa a continuidade do projeto que transformou positivamente o Brasil desde 2003 e seu aprofundamento.

No entanto, as pesquisas e o clima político e econômico mostram um cenário um pouco diferente. Somente o nível de rejeição que as pesquisas – maquiadas ou não – da Dilma e do governo – o dobro da rejeição de Aecio, segundo as pesquisas – já revela que outros fatores contam para entender as opiniões das pessoas.

Para um tecnocrata, para uma visão economicista ou positivista da realidade, a consciência é produto direto da realidade objetiva. Basta transformar a esta, que as pessoas se darão conta das mudanças e do seu significado. Não levam em conta o papel fundamental da intermediação que exercem os meios de comunicação.  A realidade concreta chega às pessoas através das representações dessa realidade, processo em que a mídia exerce um papel determinante. Essa visão ingênua não entende o que é a ideologia e como a fabricação dos consensos pela mídia monopolista atua.

A mídia conseguiu fabricar consensos como os de que a Dilma seria uma presidente incompetente, o governo seria corrupto, a política econômica fundamentalmente equivocada e a Petrobrás um problema, a inflação descontrolada, a economia estagnada e sem possibilidade de voltar a crescer. Por mais que se possa, racionalmente, desmentir cada uma dessas afirmações, são elas que permeiam os meios de comunicação e formam parte da opinião pública, contaminada pelo terrorismo em que aposta a oposição politica e seu partido – a mídia.

Uma política de comunicações desastrosa por parte do governo é responsável por esse clima, que coloca em risco a continuidade do projeto democrático e popular que o povo escolheu como seu em três eleições presidenciais. O governo ficou inerte diante da criação desse clima e o que poderia dizer ficou neutralizado porque o governo não avançou em nada na democratização dos meios de comunicação. É uma atitude grave, porque alimenta uma oposição derrotada, que se apoia no monopólio privado dos meios de comunicação para desgastar o governo, sem que este reaja.

É equivocada a alternativa entre uma imprensa barulhenta – que diga o que bem entenda – ou uma mídia calada. Esta era a alternativa durante a ditadura. Na democracia a alternativa é entre uma mídia monopolista, que só propaga a voz dos seus donos ou mídia democrática, pluralista. Ao não avançar na democratização dos processos de formação da opinião publica, o governo colocar em risco todos os avanços acumulados desde 2003.

Não por acaso os votos duros de apoio do governo – os mais pobres, os do nordeste – são os menos afetados pela influência da mídia, são aqueles influenciados assim diretamente pelos efeitos das políticas sociais do governo. E os setores de classe média das grandes cidades são os mais afetados.

O Brasil não será um país democrático, por mais que avancemos na diminuição das desigualdades sociais, se somente uma ínfima minoria pode influenciar sobre a opinião dos outros, impor os temas que lhes pareçam do seu interesse como agenda nacional, difundam o tempo todo suas opiniões. Não será democrático enquanto as pessoas possam ter acessos a bens indispensáveis, mas não possam dizer a todos os outros o que pensam.

Senão seria perpetuar a divisão entre os que trabalham, produzem, vivem no limite das suas necessidades, por um lado, enquanto por outro lado estão os que, pelo poder do dinheiro, podem ocupar os espaços de formação de opinião pública, podem influenciar os outros, impunemente.

A razão pela qual um governo que promove os direitos da grande maioria da população, até aqui excluída, tem tantas dificuldades para traduzir esses avanços numa clara maioria politica, é a mídia, é a mídia.



(Extraído do CONVERSA AFIADA, de Paulo Henrique Amorim)